Patentes Internacionais são concedidas à UFPA

Publicado em: 31/10/2016 às 14:34
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A patente é um mecanismo de proteção intelectual mais voltada para a atividade empresarial, sendo bastante utilizada no processo de inovação tecnológica. Trata-se da concessão de um direito de exclusividade temporário, que permite ao titular ter um retorno do investimento aplicado na criação de seu produto ou tecnologia. Esse título é concedido pelo Estado a quem inventa novos produtos (invenção) ou aperfeiçoa algo já existente (modelo de utilidade).

Para que a patente seja concedida é necessária a realização de um depósito do pedido de concessão às instituições responsáveis, ou seja, o inventor apresenta um relatório descritivo, mostrando a inovação de sua pesquisa, para que essas instituições analisem o material e concluam se aquilo é, de fato, algo inédito. No Brasil, o órgão responsável é o Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI), o qual é vinculado ao Sistema Internacional de Patentes (WIPO/PCT), através do qual o inventor pode procurar, simultaneamente, a proteção de uma invenção em uma grande quantidade de países.

Isso ocorre porque o pedido de patente pode ser depositado em vários países, o que não quer dizer que a patente será concedida em todos eles. Cada país tem seus métodos de análise e suas próprias patentes e, portanto, a avaliação do órgão responsável sobre a novidade de um produto ou processo, acontece de forma independente em cada um deles.

As patentes que foram concedidas à UFPA são internacionais, no Brasil elas ainda estão em análise pelo INPI.

Uma nova alternativa para malária

A professora Fani Dolabela leciona na UFPA desde 2009 e trabalha com doenças negligenciadas, que são as que atingem principalmente os países em desenvolvimento. O trabalho da professora da faculdade de Farmácia consiste na busca de alternativas terapêuticas para essas doenças, focando suas pesquisas em malária, leishmaniose e, mais recentemente, esquistossomose. A invenção de Fani que levou à concessão da patente foi a de um marcador farmacológico, presente em uma espécie de planta medicinal amazônica, que se mostrou promissor para o tratamento de malária. Fani fez o depósito da patente em 2012, no Brasil, e no ano seguinte, fez o depósito internacional. Em 2015, a patente foi concedida na África do Sul.

Durante o processo de análise, a professora já fez diversos estudos com o marcador e, segundo ela explica, a próxima fase é produzir um análogo sintético do marcador, testar seu potencial e então dar início aos estudos in vivo. Fani confessa que gostaria muito de ver o marcador transformado em medicamento, após todas as fases de análise. Ela explica que o processo para a produção de um novo medicamente é muito lento e, no seu caso, ainda existe o fato de que as doenças negligenciadas não são uma prioridade para a indústria farmacêutica. “Malária é uma prioridade para o governo federal, para a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), para a Organização Mundial de Saúde (OMS). Então nós vamos acabar envolvendo principalmente as organizações públicas, porque buscar alternativas para a malária é urgente”, conta a professora.

Fani expõe que o medicamento utilizado para o tratamento de malária, atualmente, é o Coartem, mas que já existem casos de resistência aos seus derivados em algumas regiões. Ela diz que, caso haja um aumento da disseminação de resistência ao medicamento, a consequência seria aumentar a taxa de mortalidade por malária. Por isso a professora frisa o quanto sua pesquisa é relevante, considerando que a malária é uma realidade em várias regiões do mundo, incluindo a Amazônia legal, “o que me motiva a estar aqui todos os dias é saber que o que eu estou fazendo é muito importante para a sociedade”, relata a professora.

Os metabólitos contra a leishmaniose

O professor Alberdan Santos trabalha com química e biotecnologia, leciona na UFPA há 18 anos e coordena o Laboratório de Investigação Sistemática em Biotecnologia e Biodiversidade Molecular. O trabalho de Alberdan envolve a produção de micrometabólitos e macrometabólitos, que são substâncias produzidas por plantas e microrganismos que apresentam atividades biológicas. O professor explica que, por meio da investigação sistemática, o grupo chegou em um fungo, que produz um metabólito. Este metabólito, após ser submetido a várias atividades biológicas, mostrou um potencial contra leishmaniose cutânea. O professor depositou a patente nacional em 2008 e a internacional em 2009. Após isso, ela foi pedida na União Europeia, África do Sul, Aripo e Estados Unidos, os dois últimos já enviaram as cartas-patente.

Alberdan explica que a molécula encontrada pode ser utilizada no combate à leishmaniose cutânea em seu uso tópico, porém ainda são necessários muitos testes, além da intensificação das investigações. Um desses processos é a investigação in vivo, por meio do qual será possível conhecer a atividade da molécula, bem como seus efeitos em mamíferos.

O professor afirma que os medicamentos utilizados atualmente costumam apresentar efeitos colaterais muito danosos aos pacientes e que, por isso, a utilização da molécula como medicamento tópico, em alternativa aos tratamentos atuais, traria benefícios. Como explica o professor, “Nós não observamos, até o momento, nenhum efeito colateral. Mas logicamente que nós só vamos poder afirmar isso depois dos ensaios in vivo. Porque depois disso é que serão feitos os ensaios pré-clínicos, quando vamos avaliar esses efeitos adversos. ”

O professor mencionou que, para que o medicamento possa ser produzido, seria necessário um investimento público e que a proposta não é substituir os medicamentos existentes, mas sim buscar alternativas de tratamento para a leishmaniose. “A ideia é nós investigarmos alternativas, que sejam factíveis, que possam ser usadas, que possam ser potencializadas de uma maneira racional, de uma maneira equilibrada, de uma maneira a minimizar o sofrimento dos portadores dessa doença maligna”, explica o professor.

Os nanotubos de carbono

O professor Marcos Allan trabalha na UFPA há 5 anos, atuando na área de nanotecnologia e produção de materiais. Ele desenvolveu um método de produção de nanotubos de carbono preenchidos por carbeto de alumínio. Os nanotubos de carbono representam uma nova classe de materiais com propriedades mecânicas e elétricas muito superiores aos atuais, podendo ser aplicados em têxteis, equipamentos eletrônicos, fármacos, entre outros. Segundo o professor, “os nanotubos produzidos pela técnica patenteada apresentam outras propriedades físicas que não são encontrados nos demais, como, por exemplo, maior resistência a tração quando incorporados em matriz metálica”, explica.

Marcos também demonstra que sua invenção pode ser aplicada em vários materiais para a melhoria de suas propriedades físico-químicas e para o desenvolvimento de produtos, como sensores para equipamentos eletrônicos. Marcos teve a ideia em 2006, durante seu mestrado, e a concessão veio em 2014 no Japão e, posteriormente, nos Estados Unidos. No Brasil e na União Europeia o pedido ainda se encontra em análise.

O trabalho da Universitec

Os pesquisadores da UFPA contam com a Coordenadoria de Propriedade Intelectual (CPINT) da Universitec para auxiliar nos processos referentes a depósitos de pedidos de patentes ou certificado de adição, ao registro de marcas e de programas de computador, direitos autorais e demais mecanismos de proteção. A coordenadora é Rosângela Cavaleiro, que explica a atuação da agência, “Nós trabalhamos na orientação e na efetuação do processo de depósito, fazemos o pedido e depois acompanhamos o processo junto ao órgão competente, que é o INPI”.

O processo para o depósito de patente é longo e burocrático e não é algo que seja concedido em poucos anos. O professor Marcos Allan, por exemplo, depositou seu pedido de patente nacional em 2006, a qual, após 10 anos, ainda está sendo analisada pelo INPI. Mesmo assim o pesquisador ainda tem oito pedidos em análise e afirma que recebeu amplo apoio da Universitec em todo o processo.

Assim como Marcos, os professores Alberdan Santos e Fani Dolabela também tiveram o auxílio da Universitec no depósito e concessão de suas patentes, através da orientação. Segundo Rosângela, o foco da CPINT é a orientação ao pesquisador, “nós explicamos como funciona o processo de depósito, a análise, damos orientações sobre o relatório descritivo, as reivindicações, as figuras, se houver, e o resumo, mostramos como fazer uma busca para ver se já não há nada parecido com o que ele (o pesquisador) está desenvolvendo, que é o estado da técnica”, explica a coordenadora.

O registro de produtos e processos no INPI, os pedidos de patentes, está no centro do debate sobre a inovação tecnológica e a contribuição da universidade para a competitividade da indústria brasileira, como explicou o Diretor da Universitec, Gonzalo Enríquez.

Segundo Enríquez, um dos relatórios da Organização Mundial de Propriedade Intelectual (WIPO), vinculada à Organização das Nações Unidas (ONU), mostra que o número de patentes válidas no Brasil está muito atrás de países considerados referência em inovação.

O levantamento, feito entre os 20 maiores escritórios de concessão de patentes no mundo, traz dados de 2012 e aponta os Estados Unidos em primeiro lugar, com 2,2 milhões de patentes, seguido do Japão, que tem 1,6 milhão. Depois estão China (875 mil), Coreia do Sul (738 mil), Alemanha (549 mil), França (490 mil), Reino Unido (459 mil) e até o principado de Mônaco (42.838). O Brasil está na 19ª posição, com 41.453 patentes válidas, são 211 a mais que o último lugar, ocupado pela Polônia. No bloco dos BRICS, todos estão na frente: depois da China, aparecem Rússia (181 mil), África do Sul (112 mil) e Índia (42.991).

Gonzalo afirma que esses dados devem alertar as universidades e centros de pesquisa para avançar nos pedidos de patentes. “Esse processo de patenteamento dos produtos desenvolvidos em laboratórios se constitui em um dos indicadores mais importantes para medir a competitividade da indústria, principalmente porque as indústrias inovam quando existe a transferência do conhecimento gerado nas universidades”, conclui o diretor.

Texto: Ana Paula Castro

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